Passarinho

Eu fui deixando vários pedaços pelo caminho.

Pelas pessoas.

Momentos. 

Estações.

Não posso fazer o caminho contrário e junta-los.

Seguir em frente é a única estrada que me cabe.

Perdi meus sapatos, e a estrada quente queima meus pés.

Perdi meu chapéu, e o sol queima os pensamentos que tentam me trazer conforto.

Deixei para trás meus óculos, e olhar pra luz me cega.

Minhas mãos suam todas as noites, mesmo depois que o sol se vai.

A vontade de viver, que outrora era como a chama de uma fogueira, queima minha pele.

Eu não caibo em mim.

"É um longo caminho de volta, mas de volta pra onde?".

Onde eu poderia descansar?

Onde minha alma poderia achar alento?

Conforto.

Paz.

Onde eu poderia sarar as feridas abertas?

Tentei ir pra longe, corri o máximo que pude, mas não consegui me afastar de mim.

Aonde quer que eu fosse, lá eu estava.

Me sabotando.

Puxando meu tapete.

Colocando sal nas feridas.

No fim, não fui capaz de encontrar aquilo.

Aquilo que não consegui denominar.

Que não coube em palavras.

E eu tentei tanto, tanto encontrar. 

E me entreguei.

Me dei.

Me perdi.

Sobraram vários pedaços rasgados daquilo que já não me serve.

Sou passarinho.

Passo.

Voo.

Vou e venho conforme as estações.

Tenho fases como a lua.

Agora eu morri.

Uma hora eu renasço.

Do pó. 

Da terra.

Das cinzas.

Eu fui feita no fogo.

E sobre as feridas…

é somente o preço que se paga por voar muito perto do sol.
Pam!
12/2022


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